É com alguma inquietação que tenho assistido ao “espectáculo da guerra”, espécie de big brother global, expressão final de um reality show completo: temos os bons e os maus, os fortes e os fracos, a tristeza, a ambição, a alegria, a sedução. Temos a morte, as crianças, o petróleo, a religião. As causas e os fanatismos (conforme as perspectivas).
Desde o início da guerra, já lá vão mais de duas semanas, parece que, de repente, o país se tornou mais pequeno. Os nossos medos quotidianos tornaram-se (ainda) mais insignificantes. As questiúnculas da política nacional foram-se diluindo. Restaram aquelas cujo foco é a guerra, formas colectivas de expressão que acabam por disfarçar a relativa insignificância internacional do país.
“A salvação é individual; se não nos afirmamos como país, afirmemo-nos como indivíduos”, dirão alguns. Resultam daí manifestações, boicotes eventuais, debates intermináveis, juras de fidelidade e promessas de luto. Resultam daí reflexões avisadas e conjecturas diversas.
Não conseguem, contudo, disfarçar o essencial. O mundo ultrapassou-nos. Está longe. A nova ordem é difusa, pois contém a desordem. A complexidade escancara‑nos as dúvidas e o “nosso mundo”, o nosso dia-a-dia feito de preto e branco, bem e mal, trabalho e lazer, salário e renda, on e off, belo e feio, já não a consegue enquadrar.
É desta forma que tenho assistido ao “espectáculo da guerra”. É como se as pessoas, e em particular estes dez milhões aconchegados no extremo ocidental da Europa, no meio das suas certezas aparentes, dissessem em surdina: “não sei; não entendo; começo a ficar cansado(a); muda de canal”.