sexta-feira, outubro 06, 2006

Porquê fazer diferente em Portugal?



A semana passada tive oportunidade de voltar à Roménia, mais concretamente a Bucareste, através do meu envolvimento numa rede europeia de investigadores na área da Prospectiva/Foresight. O encontro foi bastante interessante, permitindo a troca de diferentes experiências nacionais, a exploração de possibilidades de trabalho em comum e contribuindo para a “densificação” conceptual, metodológica e empírica da disciplina. O normal nestas redes europeias (quando correm bem, claro).

Eu tinha estado na Roménia há 12 anos atrás, envolvido num projecto europeu de implementação de um Business Innovation Center em Timisoara, no Oeste do País.

Na altura, a imagem que retive quer de Timisoara quer do resto do país era bastante cinzenta (apesar da reconhecida riqueza paisagística), de uma pobreza castrante, de isolamento, pouco condizente com a dimensão cultural e histórica daqueles lugares. Eram relatos de uma ditadura orwelliana, que tudo condicionava e geria, comunista e populista, protagonizada por Nicolae Ceausescu e pela sua mulher Elena.

Os carros e os autocarros caíam aos bocados, excepção feita às limousines dos traficantes (de pessoas, drogas, armas, etc.) que muito beneficiaram com os conflitos associados à desagregação da Jugoslávia.

Hoje, em Bucareste, se ainda podemos encontrar sinais da ditadura anacrónica de Ceausescu e camaradas (mas sinais similares também ainda existem, por exemplo, em Berlim), pouco mais parece restar da Roménia de 1994.

Ainda existem alguns Dacia mas a empresa foi, entretanto, comprada pela Renault. Abundam BMW e similares. As multinacionais estão presentes em todo o país e passaram a marcar a imagem da capital. O centro de Bucareste confunde-se perfeitamente com o de qualquer outra capital europeia. Escritórios da Deloitte, jovens executivos de fato escuro, design cafés e bares, restaurantes de todas as cores e feitios, irish pubs... O hotel Ibis tem quartos, em promoção, a 99€/noite (em 1994 atravessar a cidade de Timisoara num táxi a cair aos bocados e em estradas cheias de buracos custava, aproximadamente 4 escudos a câmbio da altura).

O trânsito é caótico. À noite, vejo a BBC e a Chelsea TV no meu quarto de hotel. Tudo de transforma, tudo se constrói. Estradas, auto-estradas, apartamentos, arranha‑céus. A distribuição também está em alta com a presença de grandes redes europeias como o Lidl e o Carrefour.

Também há portugueses. A Lena Construções está, por exemplo, encarregue das obras na ligação por auto-estrada entre o aeroporto e a cidade. A Coindu (estofos) também está presente na Roménia, tal como a Mota-Engil, a Infosistema (consultora em sistemas de informação) e, claro, o BCP (só para dar alguns exemplos). A casa de banho do meu hotel estava equipada com Cerâmica Valadares.

Há sinais claros de que alguns grupos portugueses (ligados fundamentalmente à construção) perceberam que podem replicar a Leste a experiência acumulada em Portugal. A Roménia é apenas um exemplo ainda embrionário.

Daí as dúvidas que tenho relativamente àqueles que defendem que é desta vez que o capital português, dada a possível redução da rentabilidade dos sectores ligados à “terra” (construção e afins) e à distribuição, irá, finalmente, começar a olhar com mais atenção para indústrias e serviços ligados ao conhecimento.

No fundo, sejamos francos, porquê fazer diferente em Portugal se se pode ganhar muito dinheiro a fazer o mesmo noutro sítio qualquer?

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